100.10.014642-1. Imissão provisória na posse – registro.
Processo 100.10.014642-1 – Dúvida
Interessada: CDHU – Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo.
Ementa: Imissão provisória na posse – registro.
- Processo 100.10.014642-1 – Posse – imissão provisória
- → Processo 100.10.014642-1 – sentença.
Sérgio Jacomino, 5º Oficial de Registro de Imóveis da Capital de São Paulo, atendendo à R. determinação de fls. 34 dos autos tem a honra de prestar as seguintes informações.
Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo – CDHU, requer a suscitação de dúvida ou, alternativamente, a formulação de consulta, nos termos do art. 198 da Lei 6.015, de 1973.
A CDHU pretende ver registrada a imissão na posse dos imóveis das matrículas 45.332, 37.987, 37.990, todas deste Registro e transcrição 31.481, do 15º Registro Predial da Capital. Para o registro da imissão provisória na posse, é necessário que se proceda à fusão das matrículas e unificação com a transcrição, nos termos dos artigos 234 e 235 da Lei de Registros Públicos – LRP.
Questão preliminar: cópia reprográfica
Admitindo-se que se configura tipicamente um conflito qualificado por uma pretensão resistida a registro em sentido estrito (art. 67, I, 36 da LRP), e que o inconformismo da CDHU se manifesta por meio de dúvida inversamente suscitada, mister destacar, como preliminar, a inviabilidade do registro quando se faça a apresentação do título em forma reprográfica.
A jurisprudência do Conselho Superior da Magistratura é simplesmente unânime. Brevitatis causa a Ap. Civ. 1.085-6/6, j. 2/6/2009, DJE 22/7/2009, Piracicaba, rel. des. Ruy Camilo[1]:
DÚVIDA PREJUDICADA. TÍTULO – CÓPIA REPROGRÁFICA. TÍTULO JUDICIAL – QUALIFICAÇÃO REGISTRAL.
REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida – Ausência de título original – Matéria prejudicial – Recurso não conhecido – Necessidade de apuração pelo Juízo da Corregedoria Permanente, em autos próprios, da conduta do Oficial, que não cumpriu devidamente o determinado no item 30 do capítulo XX das Normas de Serviço da E. CGJ – Remessa de cópias à Corregedoria Geral da Justiça
De fato, a interessada não juntou aos autos toda a documentação necessária para colimação dos objetivos que persegue com a suscitação de dúvida inversa.
Sobre tais documentos e acerca dos obstáculos erigidos pelo Registro, seguem nossas considerações.
Registro de imissão provisória na posse
A hipótese estava versada no art. 18, inc. V, §§ 4º e 5º da Lei 6.766, de 1979, na redação que lhe deu a Lei 9.785, de 1999. A mesma lei incluiria no art. 167, I, o item 36 da LRP, a previsão para o registro dos contratos oriundos daqueles parcelamentos.
Destaque-se que a alteração da LRP se fez para possibilitar o registro dos contratos oriundos de parcelamentos naquelas especialíssimas condições. A Lei 6.015, de 1973, não tratou do registro do empreendimento, razão pela qual a base legal para consumação do ato perseguido deveria ser o art. 18, V, da Lei de Parcelamento do Solo Urbano.
Esta hipótese parecia limitada às de parcelamentos do solo para fins urbanos – loteamento e desmembramento, nos precisos termos do art. 2º da Lei 6.766, de 1979. A regra não alcançaria por elastério analógico – ou por interpretação extensiva – hipóteses dissímeis, como o caso contemplado nestes autos.
Assim estávamos e assim pensávamos. Embora conhecêssemos o teor da R. decisão prolatada pelo ilustre desembargador Venício Antonio de Paula Salles, referida pela interessada (Processo 000.03.044447, fls. 7, passim), em face das inúmeras circunstâncias impeditivas do registro, referidas logo abaixo, este Ofício acabou por denegar o acesso do título pelas razões que se acham elencadas na nota devolutiva de fls. 33.
Entretanto, em 2009 – muito tempo depois da devolução formulada por este Cartório (abril de 2008, fls. 33) –, veio a lume a Lei 11.977, de 7 de julho de 2009, cujo artigo 74 alterou o Decreto 3.365, de 21 de junho de 1941, nele incluindo o § 4º do art. 15 do seguinte teor:
Art. 15. Se o expropriante alegar urgência e depositar quantia arbitrada de conformidade com o art. 685 do Código de Processo Civil, o juiz mandará imiti-lo provisoriamente na posse dos bens;
(…)
§ 4º A imissão provisória na posse será registrada no registro de imóveis competente.
Esta redação, de todo aberta, aparentemente colhe as hipóteses de desapropriação como as tratadas nestes autos. O registro da posse, quando imitida judicialmente a administração pública, autonomizou-se.
De fato, seria possível buscar uma interpretação extensiva que favorecesse o acesso do título como pretendido pela CDHU por “paridade de motivos”, como ensina Maximiliano, atentos ao espírito do texto legal, à equidade, ao interesse geral, aos princípios constitucionais (função social da propriedade) etc.
Mas os óbices que originariamente se alevantaram contra o acesso do título e a consumação do registro, como almejado pela CDHU, remanesciam, e ainda hoje se mantêm firmes. Senão, vejamos.
Unificação e fusão de matrículas
Adiantando-se às etapas necessárias para a consumação do registro do parcelamento do solo pela administração pública imitida provisoriamente na posse, a suscitante pleiteia a fusão e unificação de matrículas de proprietários distintos, resvalando no impedimento da própria Lei de Registros Públicos, que prevê, para tal modalidade de mutação, requerimento formulado pelo “proprietário”:
Art. 234 – Quando dois ou mais imóveis contíguos pertencentes ao mesmo proprietário, constarem de matrículas autônomas, pode ele requerer a fusão destas em uma só, de novo número, encerrando-se as primitivas.
Art. 235 – Podem, ainda, ser unificados, com abertura de matrícula única:
I – dois ou mais imóveis constantes de transcrições anteriores a esta Lei, à margem das quais será averbada a abertura da matrícula que os unificar;
II – dois ou mais imóveis, registrados por ambos os sistemas, caso em que, nas transcrições, será feita a averbação prevista no item anterior, as matrículas serão encerradas na forma do artigo anterior.
A Lei 9.785, de 1999, que criou a possibilidade de registro de parcelamento com base na imissão provisória de posse, alterou a Lei de Registros Públicos para permitir o registro dos contratos oriundos de tais parcelamentos, mas nada disse a respeito da fusão ou da unificação de matrículas e transcrições.
Mas parece se desenhar e configurar, aqui, um pressuposto lógico para o registro ulterior do parcelamento – como, aliás, destacado pela própria CDHU às fls. 4 dos autos. A licença urbanística municipal está aparentemente condicionada à unificação e fusão de matrículas, segundo nos afiança, embora essas exigências prévias não tenham sido documentalmente comprovadas pela interessada.
O registro da imissão provisória da posse, agora com base no § 4º do art. 15 do Decreto 3.365, de 21 de junho de 1941, aparentemente poderá ser deferido.
Resta enfrentar a questão da possibilidade jurídica de fusão e unificação de matrículas e transcrição por quem não seja o titular de domínio. Inclino-me pela positiva, embora remanesçam inúmeras questões que deverão ser apreciadas in totum e a tempo certo, quando todos os documentos necessários forem apresentados no original à qualificação registral.
Conclusões
O advento da Lei 11.977, de 2009, alterando o § 4º do art. 15 do Decreto 3.365, de 21 de junho de 1941, dissipou toda e qualquer dúvida que pudesse existir acerca da extensão da regra criada pela Lei 9.785, de 1999. O fundamento legal para a pretensão da interessada ganha um novo suporte legal.
A fusão e unificação de matrículas e transcrição parecem configurar matéria estritamente administrativa, não tisnando os direitos dos expropriados, razão pela qual não ser antevê sérios prejuízos aos próprios e a terceiros. Eventual tresdestinação ou retrocessão, em virtude de não afetação concreta aos fins indicados no decreto expropriatório – já que se vislumbra certa condicionalidade na aprovação urbanística ulterior, será decidida nas vias próprias e sempre será possível a restituição das partes ao status quo ante.
Vossa Excelência saberá dar ao caso concreto a melhor solução.
Devolvo o processo com os meus protestos de elevada estima e distinta consideração.
São Paulo, 7 de junho de 2010.
Sérgio Jacomino
Oficial Registrador.
[1] As decisões e demais referências em links podem ser consultadas aqui: http://wp.me/pcDhK-9h