Quinto Registro de Imóveis de São Paulo

Informação e prestação de serviços

Reclamação – emolumentos – cobrança indevida – exame deficiente

leave a comment »

Protocolos x, y, z, α – Reclamação – ARISP
Interessado: ACD

Reclamação. Utente que alega mal atendimento por “funcionários despreparados” que não esclarecem as dúvidas do reclamante mas cobram pela entrada sucessiva do título que, não registrado, acarreta problemas para o interessado. O pedido foi encaminhado pela ARISP em 12.9.2014 e encaminhado à Ouvidora do Quinto Registro para apuração, investigação e encaminhamento, tomando-se as providências que o caso requer.

Senhora Ouvidora.

Tendo recebido o pedido da ARISP no dia de hoje, encaminhando-nos a reclamação da interessada supra identificada, imediatamente remeti o caso à sua apreciação para que possa apurar e verificar as razões apresentadas pela reclamante, dando ao caso o melhor encaminhamento possível para esclarecer a situação e tomar as providências que achar cabíveis.

Rogo especialmente, em sendo o caso, que V. Sa. possa tomar as providências internas necessárias para corrigir eventual erro no encaminhamento do pedido de registro em tela – se assim apurar. Ou que possa providenciar uma resposta esclarecedora para a ARISP para que esta, querendo, a envie diretamente para a Sra. , com os nossos cumprimentos respeitosos [1].

A reclamação

O e-mail abaixo foi recebido pela ARISP no dia de hoje. A reclamação veio vazada nos seguintes termos:

Prezados.

1) desde Julho de 2011 estou tentando registrar um inventário e não consigo em função do cartório encontrar pendências todas as vezes que apresento uma solicitação exigida.

Segue como funciona:

1 – Entrego os documentos e tenho que pagar para eles analisarem.

2 – Eles analisam mediante o pagamento efetuado e apontam a pendência.

3 – Novamente entrego os documentos com a pendência sanada com novo pagamento e para minha surpresa aparece outra pendência.

Esta “brincadeirinha” vem ocorrendo desde 2011, onde já gastei muito com estas análises , no meu ver, mal feitas.

Quantas vezes o mesmo processo vai ser analisado e cobrado?

Até quando vou ser penalizada através de pagamentos sem fim para conseguir registrar um inventário?

Não consigo receber a orientação exata do que tenho que fazer. Deparo com funcionários despreparados a nos orientar, mas preparados a nos cobrar por serviços não efetuados.

Solicito, por favor, a intervenção de uma área competente para resolver o meu problema com relação a este cartório.

No aguardo, agradeço antecipadamente a atenção.

O exame dos títulos não é uma brincadeira…

É preciso reconhecer, de fato, que a interessada luta desde o ano de 2011 para poder registrar o seu título.

A 26 de maio de 2011 (protocolo X) ingressou neste Registro Predial o pedido de registro de formal de partilha que, examinado no prazo legal, foi o seu acesso denegado em virtude de problemas apontados, de modo preciso e exauriente, na nota devolutiva (NTD) emitida a 3 de junho.

O motivo foi singelíssimo: foi solicitada a apresentação do título anterior, i.e., apresentação dos formais de partilha pelos quais o acesso do título apresentado seria viabilizado.

Regra comezinha de direito formal registral estabelece que não se realiza o registro de um título quando este se acha na dependência da apresentação do anterior. Para maior clareza, permita-me reproduzir os artigos 195 e 237 da Lei 6.015, de 1973:

Art. 195 – Se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outorgante, o oficial exigirá a prévia matrícula e o registro do título anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continuidade do registro.

Art. 237 – Ainda que o imóvel esteja matriculado, não se fará registro que dependa da apresentação de título anterior, a fim de que se preserve a continuidade do registro.

O quadro normativo traduz o conhecido princípio de trato sucessivo (ou continuidade). Na voz de Afrânio de Carvalho, trata-se de regra basilar do sistema.

“O princípio de continuidade, que se apoia no de especialidade, quer dizer que, em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir uma cadeia de titularidades à vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Assim, as sucessivas transmissões que derivam umas das outras, asseguram sempre a preexistência do imóvel no patrimônio do transferente.

Ao exigir que cada inscrição encontre sua procedência em outra anterior, que assegure a legitimidade da transmissão ou da oneração do direito, acaba por transformá-la no elo de uma corrente ininterrupta de assentos, cada um dos quais se liga ao seu antecedente, como o seu subsequente a ele se ligará posteriormente. Graças a isso o Registro de Imóveis inspira confiança ao público” [2].

Note-se que o exame do primeiro título nem sequer se realizou. Frustrou-se. Por uma questão lógica, não é possível confrontar um título posterior com um anterior que não foi registrado e nem sequer nos foi apresentado…

A jurisprudência do Conselho Superior da Magistratura é copiosa. Cito apenas a Ap. Civ. que conta com indicação de outros precedentes:

REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida – Formal de partilha – Transmissão per saltum que se não coaduna com o princípio da continuidade (Lei nº 6.015/73, arts. 195 e 237) – Jurisprudência do Conselho Superior da Magistratura – Recurso não provido. → Ap. Civ. 0002506-52.2009.8.26.0383, Nhandeara, j. 27.10.2011, Dje 27.1.2012. rel. des. Maurício Vidigal

Ainda assim, e para poupar tempo ao interessado e, ainda em seu favor, adiantar o que era possível adiantar de uma documentação que, de modo defectivo, nos foi apresentada, ainda assim foram solicitados alguns documentos que seriam necessários em nova sazão registral para o registro perseguido.

A nota técnica devolutiva é clara e objetiva, indicando, inclusive, os precisos fundamentos legais. A NTD acha-se à disposição de quem queira consultá-la no site www.registradores.org.br.

Aconselhamento, consultoria e assessoria jurídicas

O primeiro comentário que cabe aqui deixar consignado é que o Cartório de Registro de Imóveis não funciona – nem deve atuar – como órgão de aconselhamento, consultoria e assessoria jurídica, a indicar quais seriam os caminhos técnicos-jurídicos adequados para solucionar os problemas claramente apontados por nós. Calha lembrar, a propósito, a vedação contida no art. 1º do Estatuto da Advocacia (Lei 8.906, de 4.7.1994):

São atividades privativas de advocacia:

(…)

II – as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas

A nossa atribuição é limitada. Socorro-me das Normas de Serviço baixadas pela Eg. Corregedoria Geral da Justiça, que, em seu item 40 e ss. rezam:

40. É dever do Registrador proceder ao exame exaustivo do título apresentado. Havendo exigências de qualquer ordem, deverão ser formuladas de uma só vez, por escrito, de forma clara e objetiva, em formato eletrônico ou papel timbrado do cartório, com identificação e assinatura do preposto responsável, para que o interessado possa satisfazê-las ou requerer a suscitação de dúvida ou procedimento administrativo.

40.1. A nota de exigência deve conter a exposição das razões e dos fundamentos em que o Registrador se apoiou para qualificação negativa do título, vedadas justificativas de devolução com expressões genéricas, tais como “para os devidos fins”, “para fins de direito” e outras congêneres.

A nota é clara e objetiva e indica os fundamentos de fato e de direito (legais) em virtude dos quais o registro não se fez.

Curioso notar que, gozando – como gozam todos os interessados – da faculdade de recorrer da decisão da primeira nota devolutiva, pela via da dúvida [3], somente agora, passados mais de 3 anos, vem a utente reclamar da primeira exigência.

Mas regra não se encerra aqui. Note o item 40.2:

40.2. Ressalva-se a emissão de segunda nota de exigência, exclusivamente, na hipótese de, cumpridas as exigências primitivamente formuladas, surgirem elementos que não constavam do título anteriormente qualificado ou em razão do cumprimento parcial das exigências formuladas anteriormente.

A regra é muito clara e autoexplicativa, não demandando maiores considerações. De fato, cada reapresentação do título, significou novas exigências fundadas na inovação documental.

Enfim, munido de uma singela certidão expedida pelo Registro de Imóveis, qualquer advogado poderia conhecer perfeitamente a situação jurídica de qualquer imóvel e tomar as providências necessárias para que o título fosse imediatamente registrado, sem os percalços percebidos na tramitação destes títulos.

Mas a saga continuou e o título foi reapresentado em nova oportunidade.

Continuando a continuidade – parte I

Em 27 de agosto de 2012 (protocolo 260.773), ingressou novamente o mesmo título, cujo exame foi sobrestado, novamente, pela concorrência de dois outros, que foram prenotados anteriormente: y e z.

A rigor, deveria ser seguida a ordem sequencial dos títulos, em virtude da ordem de precedência e prioridade do registro (art. 11 c.c. art. 186 da Lei de Registros Públicos).

Neste caso, tendo conhecimento da concorrência dos 3 títulos, era dever do Cartório analisá-los, ainda que a ordem estivesse embaralhada. E assim se fez. Mas, uma vez mais, não por culpa deste Registro, o acesso do título nas tábuas registrais não se fez.

Por quê? No exame que se fez dos títulos prenotados sob os números y e z (os tais títulos anteriores que haviam sido solicitados) verificou-se que haviam novos documentos a serem apresentados (certidão de casamento, pacto antenupcial etc.). É preciso deixar claro o seguinte: não se pode antecipar quais documentos serão necessários sem se saber antecipadamente… quais serão necessários! Parece uma “brincadeirinha” lógica de crianças.

Outro aspecto relevante a ser destacado: o advogado (ou profissional da área) pode antever essas exigências mediante a singelíssima leitura da certidão da matrícula, confrontando-a com o título em seu poder.

Uma vez mais, reconheça-se: a responsabilidade pelo atraso não é nossa.

Reingressando os títulos, atendidas as nossas exigências, foram prenotados e registrados (Matrícula).

Sra. Ouvidora, note esta data do registro: 23 de novembro de 2012. Mais adiante vamos nos referir a ela.

Continuando a continuidade – parte II

A saga continua. Passados praticamente 2 anos, sem qualquer provocação, somente agora, a 24.7.2014, os interessados reingressaram o primeiro título (x, de 26.5.2011), prenotado sob número a (24.7.2014).

Uma vez mais, o título foi escrupulosamente examinado e posto em exigências, todas indicadas devidamente na nota devolutiva correspondente.

Os problemas são técnicos e jurídicos e competem ao advogado responsável pela ação de inventário resolver da melhor maneira que julgar.

Aqui cabe uma crítica interna: depois de indicar os problemas encontrados no formal de partilha, este cartório extrapolou suas atribuições ordinárias indicando formas de se resolver o problema. A responsabilidade pela solução do problema é do interessado – não do cartório. Ao indicar a “forma de se transmitir a parte faltante” o cartório assume a responsabilidade de aconselhamento jurídico que não é sua atribuição legal. Fica a observação para que se baixe recomendação técnica impedindo oferecer soluções que somente aos interessados, devidamente assistidos (notários, advogados, economiários, documentaristas, etc.).

Continuando a continuidade – parte III

Por incrível que pareça, o mesmo título (b), em cópia, foi prenotado sob número “a”, representando uma despesa completamente desnecessária para a usuária. A completa falta de orientação e esclarecimento dos apresentantes dos títulos representou, neste caso, uma despesa evitável.

A cópia reprográfica é simplesmente imprestável para o registro. Uma vez prenotada, foi examinada, conferida e… devolvida!

Conclusões

  • Equívocos. Não vislumbramos quaisquer equívocos no exame de toda a documentação. Este cartório houve-se com zelo e perícia na tramitação dos títulos. Nada há a reparar.
  • Pendências inesperadas. Diz a reclamante que o cartório “encontra pendências todas as vezes que apresento uma solicitação exigida”. Por quê? Porque sempre se apresentam novos elementos ao exame. Falta perícia no entendimento das exigências deste cartório. Os profissionais do direito, encarregados da feitura do título judicial, têm o dever de interpretar as exigências e evitar os transtornos observados.
  • Emolumentos. A cobrança dos emolumentos é legal e prevista na Tabela de Custas. Ela pode ser consultada aqui: anoregsp.org.br. Toda vez que o título é apresentado, desencadeia um exame minucioso e técnico que envolve toda a estrutura do cartório. O pagamento, em cada uma dessas etapas, remunera, legal e justamente, o trabalho feito pela serventia. Insistimos: o pagamento não seria necessário se o documento viesse perfeitamente adequado para o registro.
  • “Brincadeirinha”. O trabalho do Cartório não é brincadeira. Ninguém brinca emitindo notas técnicas, que ostentam caráter oficial, assinando-as sob integral responsabilidade, sem estar inteiramente convencido da regularidade do processo. Trata-se de uma afirmação leviana e que pode levar a responsabilidade – exigindo-se que se prove que houve “brincadeirinhas” no exercício de uma atividade pública.
  • “Funcionários despreparados”. Os nossos escreventes, como sabe a Sra. ouvidora, longe de serem “despreparados”, são todos formados em Direito. Mais ainda: todos são pós-graduados em Direito Registral pela conceituada Escola Paulista da Magistratura. Está será outra afirmação leviana e completamente despida de qualquer conhecimento e fundamento. Reputo os excessos à falta de urbanidade e educação no trato com as coisas sérias do trabalho.

Era o que me competia informar.

Devolvo este processo à Sra. Ouvidora, para as providências que julgar oportunas e necessárias.

São Paulo, 15 de setembro de 2014.

SÉRGIO JACOMINO,

Oficial.

[1] Toda a documentação que nos foi apresentada – desde os formais, documentos, notas devolutivas e planilhas – acham-se perfeitamente arquivadas e poderão, ser for o caso, ser examinada, bastando solicitação a este Oficial.

[2] Carvalho. Afrânio. Registro de Imóveis. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1982, p. 304.

[3] Como se acha indicado no item 40 in fine, os interessados poderiam suscitar dúvida, nos termos do art. 198 da Lei 6.015/1973: “Havendo exigência a ser satisfeita, o oficial indicá-la-á por escrito. Não se conformando o apresentante com a exigência do oficial, ou não a podendo satisfazer, será o título, a seu requerimento e com a declaração de dúvida, remetido ao juízo competente para dirimi-la…”. O cartório dispõe de orientações para a suscitação aqui: http://cartorios.wordpress.com/duvida-registral/

Written by SJ

15 de setembro de 2014 às 1:39 PM

Deixe um comentário

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.

%d blogueiros gostam disto: