Quinto Registro de Imóveis de São Paulo

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1046567-34.2021.8.26. CCB – Novação

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Processo Digital nº: 1046567-34.2021.8.26.0100. Pedido julgado improcedente em 8/6/2021 (Dje 10/6/2021), Dra. Vivian Labruna Catapani. Acesso: http://kollsys.org/qd8. Recurso em que se deu provimento: http://kollsys.org/r99

Requerente: BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A.

CCB – novação ou não? – that´s the question…

A tormentosa questão sobre as mutações que ocorrem na vida dos contratos celebrados sob a égide da Lei 10.931, de 2004, ainda não se acha totalmente superada, embora depontem indicações que parecem indicar uma orientação uniforme pra os Cartórios de Registro de Imóveis.

Assim, de acordo com as mais recentes decisões da Eg. Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo, o elemento destacado e diferenciador, hábil para descaracterizar a novação, será o fato de não ocorrerem novos aportes na dívida original. Simples atualizações representariam meras mudanças ou modificações da obrigação original, e modo que as alterações podem ser admitidas[1].

O fato é que não estamos diante de uma matéria muito fácil de aclarar e qualificar precisamente e quadrar as situações que exsurgem das novas figuras da engenharia jurídico-financeira.

A própria CGJSP, em importante precedente, deixou consignado que “há dificuldade interpretativa para a configuração do ânimo de novar, de acordo Jorge Cesar Ferreira da Silva (Adimplemento e extinção das obrigações. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 439), não há um critério absoluto para a consideração do ânimo de novar”. É muito difícil caracterizar se a alteração efetuada “tratou de elementos acessórios ou envolveu mudança do objeto ou da causa da obrigação, caracterizando novação”.

Como se verá, essa dificuldade se magnifica no âmbito dos originais títulos de crédito criados pela Lei 10.931/2004. De fato, o mesmo precedente deixará constância de que a qualificação da natureza jurídica do negócio entabulado pelas partes não dependerá da denominação por elas indicada, mas do “diálogo entre o fato e o ordenamento jurídico”[2]. Portanto, não será suficiente a declaração, no próprio aditivo, que a alteração “não constitui novação da dívida”.

As CCB´s são figuras extravagantes. São títulos de crédito (art. 26 da Lei 10.931/2004), podem ser escriturais e emitidas em meios eletrônicos (art. 27-A), circulam em plataformas digitais, representam uma dívida em dinheiro que deve ser “certa, líquida e exigível”, como em todos os títulos de crédito, mas a dívida pode ser apurada “pelo saldo devedor demonstrado em planilha de cálculo” (art. 28), valor que deve ser apurado pelo credor (§2º do dito artigo). Ou seja, o elemento essencial da obrigação flutua no decorrer do tempo…

Há toda uma série de disposições muito específicas que emprestam a tais títulos de crédito uma tal singularidade que torna difícil quadrá-los nos estereótipos tradicionais das figuras jurídicas conhecidas.

Seja como for, a garantia real que pode ser embarcada na cédula (art. 32) não se confunde com o negócio subjacente que ela representa. A modificação dos elementos próprios e ínsitos em todos os títulos de crédito poderá (ou não) representar uma novação, ainda que se não lhe empreste ao negócio essa denominação. Nem mesmo a diminuição do valor, nem tampouco a modificação da taxa de juros, alteração de número de parcelas, ou de quaisquer outras condições, afastaria, inequivocamente, a configuração da novação. É possível, mesmo, que a novação não calhe nesta figura jurídica…

Enfim, já que cabe ao credor recalcular o valor da dívida e expressá-lo por planilhas, o conjunto de tais circunstâncias leva a questão para o âmbito da prova e do contraditório. Assim, somente uma análise do caso concreto permitirá quadrar esses instrumentos financeiros em um sistema seguro e imperar uma solução firme.

Mesmo quando se declare no título, ou no pleito de dúvida ou de pedido de providências, que “permanece a obrigação principal inalterada”, uma vez obstado o registro caberia ao interessado “ilidir tais argumentos, afirmando (e provando) que essas alterações não dizem respeito aos elementos essenciais da obrigação”[3]. Ou seja, a análise da registrabilidade do título sempre levaria a uma espécie de cognição, ainda que sumária, com dilação probatória, como a própria Eg. Corregedoria Geral reconhece: “caberá à instituição financeira a prova de que, naquele caso concreto, os requisitos da novação não se fazem presentes”.

Em conclusão, a questão no fundo extrapola os limites da cognição estrita, própria do âmbito registral, e redireciona a questão ao âmbito jurisdicional, se acaso se instaurar qualquer conflito entre os contratantes. Eventual controvérsia não se resolverá no âmbito administrativo do Registro de Imóveis, mas na via jurisdicional, onde se instaurará o contraditório e se permitirá a ampla defesa, com a natural produção de provas. 

Até lá, preservando a preferência dos direitos reais, parece mesmo prudente admitir essa modalidade de averbação.

V. Excelência apreciará os sólidos argumentos e a fundamentação jurídica tão bem expostos pelas Sras. Advogadas, Dras. SIMONE A. GASTALDELLO e ADRIANA SANTOS BARROS e decidirá soberanamente.

Estas eram as informações que presto a Vossa Excelência, sempre com o devido respeito e acatamento.

São Paulo, 27 de maio de 2021.

SERGIO JACOMINO, registrador.


[1] Processo CG 1002445-62.2020.8.26.0037, Araraquara, decisão de 29/9/2020, Dje 9/10/2020, des. Ricardo Mair Anafe. Acesso: http://kollsys.org/pir. Processo CG 1025107-22.2016.8.26.0114, Campinas, decisão de 23/7/2019, Dje 30/7/2019, des. Geraldo Francisco Pinheiro Franco. Acesso: http://kollsys.org/nkm.

[2] Ap. Civ. 1132901-47.2016.8.26.0100, São Paulo, j. 11/12/2018, Dje 31/1/2019, rel. des. Geraldo Francisco Pinheiro Franco. Acesso: http://kollsys.org/mba.

[3] Processo CG 0000830-93.2017.8.26.0252, Ipauçu, decisão de 14/10/2019, Dje 25/10/2019, des. Geraldo Francisco Pinheiro Franco. Acesso: http://kollsys.org/o2s.

Written by SJ

13 de junho de 2021 às 7:51 PM

Publicado em 2021 - Dúvidas & informações

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Uma resposta

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  1. Deixei assinalado que o conhecimento das circunstâncias em cada caso concreto dependerá da avaliação do próprio registrador. Todavia, antes que os tribunais possam reconhecer a independência e autonomia jurídicas do registrador — “em sua ordem” — não lhes resta outra saída que não a desconfortável de submeter à apreciação do juízo competente, juízo, que, afinal, atua na esfera estritamente administrativa.

    A questão do valor jurídico da qualificação registral e das proclamações que decorrem de sua atuação é matéria que se acha à espera de um bom jurista. SJ

    Iacominvs

    13 de junho de 2021 at 7:55 PM


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