583.00.2008.172055-6. emolumentos – partilha
Custas e emolumentos. Reclamação – valor de cobrança. Partilha – ato de registro ou averbação.
Ementa não-oficial: Partilha em separação judicial. Imóveis partilhados em comum entre os separandos. O formal de partilha ingressa no Registro por ato de averbação e o critério de cobrança de emolumentos é a prática de ato com valor declarado (item II, 1, das Notas Explicativas da Lei 11.331/2002) .
- Processo 583.00.2008.172055-6 – Sentença
Senhor Juiz-corregedor:
Em atenção ao R. despacho de fls. 62, presto os esclarecimentos e informações a Vossa Excelência, com o devido respeito e acatamento.
O cerne da questão se resume a verificar se o ato a ser praticado, pelo Registro, é o de mera averbação de separação (art. 167, II, 5 c.c. art. 246 § 1º da Lei de Registros Públicos) ou de averbação de partilha decorrente de separação (art. 167, II, 14 da mesma lei). Fica descartada a hipótese do registro de partilha decorrente de separação (art. 167, I, 25 da LRP) em decorrência de previsão normativa, como se verá abaixo.
Dependendo do entendimento que se possa esposar, um ou outro enquadramento legal implicará a aplicação de um ou outro item da Tabela de Custas.
Preliminarmente, é preciso destacar que a partilha dos bens foi medida expressamente requerida pela autora da ação (fls. 19), a qual foi deferida, com a atribuição dos bens imóveis a ambos os separandos.
Registro ou averbação?
A questão não é nova e vem repercutindo desde o advento da Lei 6.850, de 1980, que alterou a Lei de Registros Públicos.
Dita lei visou compatibilizar as regras da Lei de Registros Públicos com o estatuto processual (art. 1.134 do CPC). A medida acabou por redundar numa grande confusão, em grande parte esclarecida a partir de uma importante decisão desta Primeira Vara de Registros Públicos, de lavra do eminente desembargador José de Mello Junqueira, então juiz titular.
À evidência foi um cochilo de legislador e as razões do erro são bastante conhecidas (brevitatis causa: Processo 124/1981, decisão de 24.6.1981, José de Mello Junqueira, in RDI 8-157).
A referida decisão fixou algumas balizas interpretativas e que podem ser assim resumidas:
- Dar-se-á simples averbação quando houver tão-somente alteração do estado civil das pessoas interessadas no registro ou quando se alterar o caráter jurídico do condomínio (art. 167, II, 14 da LRP).
- Ocorre o registro, quando, sucessivamente à separação, dá-se a partilha de bens (art. 167, I, 25 da LRP).
Diz aquele R. julgado que as sentenças de separação judicial (ou divórcio), quando homologam a partilha dos bens do casal “contêm, em verdade, dois dispositivos distintos: um ordenamento sobre a situação de estado das pessoas envolvidas e outro sobre o domínio dos bens, como conseqüência ao ordenamento primeiro”.
Assim, tratando-se de formal de partilha, o registrador deverá registrá-lo, pouco importando a circunstância de a escrivania judicial “expedir um mandado ou uma carta de sentença, ao invés do formal de partilha”. E segue o R. julgado:
“O rótulo não desnatura a natureza do título. Partilhados os bens, o instrumento que documenta esse ato judicial é um formal de partilha, qualquer que seja o título que o encabeça, devendo conter, para se aperfeiçoar, todas as formalidades exigidas em lei. Tratando-se de um formal de partilha, o registrador deverá registrá-lo (inscrevê-lo), por força do n. 25 do inciso I do art. 167 da Lei 6.015/73”.
“A Lei 6.850/80, ao exigir a averbação das sentenças de separação judicial, de divórcio e de nulidade ou anulação de casamento, deixou íntegro o registro (inscrição) dos formais de partilha, no n. 25 do inciso I do art. 167 da Lei 6.015/73, obrigando esse ato quando, de fato, houver uma divisão de bens entre os cônjuges, por declaração expressa judicial”.
A R. decisão, oriunda da Primeira Vara de Registros Públicos de São Paulo, acabou gerando o Comunicado CG 12/1982, da Corregedoria-Geral da Justiça de São Paulo, vazado nos seguintes termos:
Aos Ofícios do Registro de Imóveis do Estado.
A Corregedoria Geral da Justiça comunica aos Srs. Oficiais do Registro de Imóveis do Estado que, atendendo à solicitação do MM. Juiz de Direito da 1ª Vara de Registros Públicos da Capital, acolheu a orientação no sentido de:
a) ser objeto de registro a sentença de separação judicial, de divórcio, ou que anula o casamento, quando decidir sobre partilha de bens imóveis, ou direitos reais registráveis (art. 167, 1, n. 25, da Lei de Registros Públicos), e de
b) ser objeto de averbação a sentença de separação judicial, ou de nulidade ou anulação de casamento, que não decidir sobre a partilha dos bens dos cônjuges, ou que apenas afirmar permanecerem estes, em sua totalidade, em comunhão (art. 167, 11, n. 14, da Lei de Registros Públicos), atentos, neste caso, para a mudança do caráter jurídico da comunhão, com a dissolução da conjugal (art. 267 do CC) e surgimento da condominial pro indiviso (art. 623 e ss. do CC).
A partir de então, as regras ficaram perfeitamente esclarecidas.
O acordo de partilha de bens, pactuado na separação judicial, ostenta um caráter acessório em relação à separação propriamente dita. A partilha faz cessar os efeitos patrimoniais da sociedade conjugal extinta.
Por essa razão, dever-se-ia considerar que o ato a ser praticado fosse o de registro em todos os casos em que haja partilha de bens, com ou sem atribuição de quinhão exclusivo aos separandos. Não se confundem a comunhão de bens decorrente do regime matrimonial e o condomínio pro indiviso. Aquela, mancomunhão, está ainda jungida à sociedade conjugal desfeita; esta pode ocorrer em sucessão à partilha, quando se decida que os bens remanesçam em condomínio ordinário, como se dá no presente caso.
O registro da partilha (ou averbação), mesmo quando se decida que o bem imóvel fique em condomínio indiviso, tal ato ostenta o caráter declaratório – como de resto ocorre nos casos de divisão. Mas tal registro, todavia, é constitutivo de efeitos – e o mais importante deles é a disponibilidade. Diz Yussef Cahali:
“Enquanto pende a comunhão, a alienação que qualquer deles venha a fazer de sua porção ideal a terceiro somente pode ser transcrito no Registro Imobiliário depois da partilha dos bens do casal e do registro do respectivo formal ou da extinção do condomínio por outras formas”. (Cahali. Youssef. Divórcio e separação. 11ª ed. São Paulo: RT, 2005, p. 748).
Tendo em vista o exposto, compreende-se que os interessados poderiam simplesmente requerer a averbação da dissolução do vínculo conjugal, bastando, para tanto, apresentar requerimento acompanhado de documento expedido pelo Registro Civil (art. 167, II, 14 c.c. art. 246, § 1º da LRP).
Poderiam, ainda, nessa linha de raciocínio, dispor do bem sem o prévio registro da partilha, malgrado o fato de a Lei do Divórcio assim o exigir (art. 31 da Lei 6.515, de 1977), desde que ambos compareçam alienando conjuntamente.
Assim tem decidido o Eg. Conselho Superior da Magistratura de São Paulo: o registro ou averbação da partilha será dispensável quando ambos transmitem os bens que permaneceram em condomínio, bastando, nesse caso, a simples averbação da separação. Confira-se:
Condomínio. Separação. Partilha de bens – registro prévio. Averbação de separação e divórcio.
EMENTA: Registro de Imóveis – Dúvida – Condomínio – Escrituras integrativas de um mesmo ato negocial – Desnecessidade de escritura de reti-ratificação – Não exigibilidade em separação judicial de condôminos – Recurso improvido.
(…)
Em se tratando de condôminos que adquirem como casados e vendem como separados, basta comparecimento de ambos para suprir necessidade de prévio registro da carta de sentença, averbando-se previamente a separação. Ap. Civ. 23.756-0/8, j. 14.7.1995, Campinas, Relator Des. Antônio Carlos Alves Braga).
Em conclusão, entendo que o ato a ser praticado, no caso de partilha de bens em que o acervo remanescesse em comum, seria o de registro.
Há, inclusive, precedente nesse sentido.
Julgando dúvida suscitada pelo 14º Registro de Imóveis da Capital, que denegou acesso de carta de sentença (em que os imóveis são partilhados em partes iguais) sem o prévio depósito de custas e emolumentos devidos pela prática do ato de registro, o magistrado Oscar José Bittencourt Couto deixou consignado:
“A Carta de Sentença deve ser registrada tendo em vista que o imóvel foi partilhado entre os cônjuges, mesmo porque o divórcio, que extingue a sociedade conjugal, por imperativo de lei, só é decretado se partilhado os bens. Tendo havido a partilha, em atenção ao princípio da continuidade, necessário o registro, mesmo que o bem tenha sido atribuído na proporção de 50% (cinqüenta por cento) para cada um dos cônjuges, visto que com a partilha tornaram-se condôminos do imóvel, não mais comungam o imóvel em razão do regime adotado no casamento”.
E conclui:
“Engana-se o requerente quando afirma que a Carta de Sentença deve ser utilizada para ato de averbação de alteração do estado civil e do nome da ex-mulher, pois, como dito acima, há necessidade de registro de partilha em observância ao princípio da continuidade registrária”. (Processo 000.99.074653-4, 1ª VRPSP, Dr. Oscar José Bittencourt Couto).
Todavia, em atenção às referidas decisões e recomendações, este Registro procedeu à inscrição da partilha homologada por ato de mera averbação, considerando-se o valor atribuído a cada um dos cônjuges.
A averbação se fez em virtude de expressa determinação constante do já referido Comunicado CG 12/1982, e com base no item 1, letra b, n. 14, Cap. XX, das NSCGJSP. Esse é o sentido da jurisprudência (brevitatis causa: Ap. Civ. 5.188-0, Pacaembu, DOE 14.3.1986, des. Sylvio do Amaral, Ap. Civ. 18.671-0/8, j. 17.9.1993, rel. des. José Alberto Weiss de Andrade e Processo CG 4/1990, j. 11.1.1990, Dr. Ricardo Cintra Torres de Carvalho).
Averbação – conteúdo econômico
Posto que o ato a ser praticado é o de mera averbação, resta saber se o critério de cobrança se orienta no sentido de se considerar o ato com conteúdo econômico ou não.
O critério deve partir da natureza do ato a ser praticado:
- Ato sem valor (Item II.4 das Notas Explicativas anexas à Lei 11.331, de 2002): simples averbação de alteração do estado civil das pessoas interessados no registro (art. 167, II, 14 da LRP).
- Ato com conteúdo econômico (Item II.1 das Notas Explicativas anexas à Lei 11.331, de 2002): quando, sucessivamente à separação, dá-se a partilha de bens.
Por coincidência, há um precedente deste Quinto Registro de Imóveis em que se discutia o critério de cobrança nos casos que-tais. O eminente magistrado titular da Primeira Vara de Registros Públicos, Dr. Asdrubal Nascimbeni, decidindo representação formulada contra este Registro, deixou consignado:
“Insustentável a tese do requerente ao pretender que a averbação fosse considerada sem valor declarado, para o efeito de cálculo de emolumentos. Não obstante não se tratar de transferência de domínio, devendo por isso proceder-se à averbação da carta de sentença, consoante já apreciado no Proc. CG n. 4/90 da Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, esse ato averbatório, para ter ingresso registral, deve ser precedido do pagamento das custas e emolumentos, cuja base de cálculo será o valor venal constante do lançamento do IPTU”.
E conclui o ilustre magistrado:
“Dissolvida a sociedade conjugal, termina a comunhão de bens, e estes passarão a ser regidos pelas normas que regem o condomínio (…)”.
“Essa mutação jurídica patrimonial, causada pela dissolução da sociedade conjugal, que é publicizada no registro imobiliário, não pode ser considerada singela averbação sem valor declarado”. (Processo 21/1996, 1ª VRPSP, Dr. Asdrubal Nascimbeni).
Por fim, aduz o meritíssimo juiz-corregedor, na decisão supra referida, que houve, efetivamente, ao longo do tempo, alteração do valor da coisa (item II.1 das Notas Explicativas), ao que eu acrescentaria: houve igualmente mudança no contrato matrimonial, com a mutação do regime jurídico da comunhão e a agregação da faculdade de plena disposição da fração ideal correspondente (mesmo item da Tabela de Custas).
Permito-me anexar as planilhas de cálculo que atestam o acerto da cobrança, ressalvado entendimento diverso da Vossa Excelência.
Aproveito do ensejo para apresentar a Vossa Excelência os protestos de elevada estima e distinta consideração.
São Paulo, 29 de agosto de 2008.
Sérgio Jacomino,
Quinto Oficial