1055983-36.2015.8.26.0100. doação – aquisição de imóvel por menor impúbere – necessidade de alvará judicial
- Processo 1055983-36.2015.8.26.0100 – sentença – dúvida procedente
- Processo 1055983-36.2015.8.26.0100 – decisão CSM – Dúvida improcedente
À Exma. Sra. Dra. TÂNIA MARA AHUALLI,
MM. Juíza da 1ª Vara de Registros Públicos de São Paulo.
Protocolo 286.751 – Interessado – L M
Doação. Aquisição de imóvel por menor impúbere – necessidade de alvará judicial.
SÉRGIO JACOMINO, 5º Oficial de Registro de Imóveis da Capital de São Paulo, atendendo ao requerimento formulado por L M, vem suscitar dúvida, pelos fatos e fundamentos a seguir deduzidos.
Procedimentos preliminares
Foi apresentada para registro escritura pública de doação com reserva de usufruto (livro xxxx, págs. xx), lavrada em 27/02/2015 pelo 2º Tabelião de Notas desta Capital, referente ao imóvel objeto da transcrição n. xxx (apartamento n. xx do Edifício xx, situado na rua xx, n. xx), em que figura como doador L M, e como donatários C G S, M S A S e M S A S.
O título foi devolvido, tendo reingressado com requerimento de suscitação de dúvida, subscrito pelo doador, achando-se prenotado sob n. 286.751, permanecendo em vigor a inscrição até solução deste processo de dúvida, nos termos do art. 203 da Lei 6.015, de 1973.
Da escritura de doação
Da referida escritura de doação consta que os donatários M S A S e M S A S são menores impúberes, ambos representados somente por sua mãe C G S (também donatária). Quanto ao pai dos menores, não consta da escritura o seu comparecimento.
Os menores recebem cada um 40% da nua propriedade e a mãe recebe 20% da nua propriedade. O usufruto vitalício foi reservado pelo doador L M, que não tem qualquer grau de parentesco com os donatários.
O imóvel fica, ainda, gravado com as cláusulas de impenhorabilidade e incomunicabilidade vitalícias, bem como inalienabilidade temporária, até que os donatários M e M completem a maioridade.
O título foi devolvido para que constasse da escritura a autorização judicial (alvará) para aquisição do imóvel pelos menores absolutamente incapazes, não bastando, portanto, a representação materna.
Das razões de recusa
Exige a legislação prévia autorização judicial para atos do representante que ultrapassem a simples administração dos bens dos menores.
O artigo 1.691 do Código Civil assim dispõe:
Não podem os pais alienar, ou gravar de ônus real os imóveis dos filhos, nem contrair, em nome deles, obrigações que ultrapassem os limites da simples administração, salvo por necessidade ou evidente interesse da prole, mediante prévia autorização do juiz.
Também o item 41, “e”, subseção I, seção IV, Cap. XIV, das NSCGJ estipula a necessidade de alvará judicial nos seguintes termos:
O Tabelião de Notas, antes da lavratura de quaisquer atos, deve:
e) exigir os respectivos alvarás, para os atos que envolvam espólio, massa falida, herança jacente ou vacante, empresário ou sociedade empresária em recuperação judicial, incapazes, sub-rogação de gravames e outros que dependem de autorização judicial para dispor ou adquirir bens imóveis ou direitos a eles relativos, sendo que, para a venda de bens de menores incapazes, o seu prazo deverá estar estabelecido pela autoridade judiciária. (grifo nosso)
Resta saber quando o ato se trata ou não de mera administração dos bens do menor. A aquisição de imóvel, ainda que a título gratuito, s.m.j., ultrapassa esse limite. Isso porque a lei exige prévia autorização do juiz, mesmo no caso de “evidente interesse da prole”, conforme os termos do artigo 1.691 do Código Civil.
A doação, por sua natureza, pode levar a supor que sempre algo se acrescenta ao patrimônio e que nada se perde, não havendo possibilidade de prejuízo. Sabemos, contudo, que a realidade não é essa, e que a aquisição de bem imóvel envolve obrigações que ultrapassam o simples momento do ato notarial.
Ademais, ao analisar a escritura de doação ora apresentada, verificou-se o seguinte: a) o pai dos menores não compareceu ao ato e não há qualquer justificativa para sua ausência; b) não há qualquer grau de parentesco entre doador e donatários. É verdade que nenhum desses fatos impede a doação. Contudo, por prudência e cautela, no conjunto dos fatos, verificou-se a necessidade da presença da autoridade judiciária.
Nesse sentido, decisão do Conselho Superior da Magistratura, nos autos da Apelação Cível 0072005-60.2013.8.26.0100, publicada em 03/12/2014:
“Observa-se, de início, que na escritura pública de compra e venda de fls. 21/23 o menor está representado apenas por seu pai. Não se faz qualquer menção à mãe ou à razão pela qual ela não compareceu ao ato notarial.
É certo, contudo, que o art. 1.690, em consonância com o art. 1.634, inciso V, também do Código Civil, prescreve que compete aos pais e, na falta de um deles, ao outro, com exclusividade, representar os filhos menores de dezesseis anos. E o parágrafo único, por sua vez, diz que os pais devem decidir em comum às questões relativas aos filhos e a seus bens; havendo divergência, poderá qualquer deles recorrer ao juiz para a solução necessária.
Aqui, não se verifica nenhuma razão para que a mãe tenha deixado de comparecer na escritura. Não há falta dela – veja-se que outorgou procuração na fase de contrarrazões -, impedimento ou incapacidade, fatos que poderiam justificar a exclusividade da representação pelo pai.
Logo, apenas por essa razão já não se poderia registrar a escritura, tal como elaborada.” (grifo nosso)
E ainda: “…o filho absolutamente incapaz havia de ter sido representado por ambos os pais, já que não havia óbice para que algum deles comparecesse (CC/2002 , art. 1.690)”.
O item 41 das normas da Corregedoria, por sua vez, não distingue a forma de aquisição de bens imóveis por menores, se a título gratuito ou oneroso, exigindo, em princípio, o alvará judicial para todas as situações. Nos termos da decisão acima citada, “em nenhum momento o item dispõe que não é necessário alvará para a aquisição de imóvel por menor incapaz. Ao contrário, é claro ao afirmar a exigência de alvará para atos que envolvam incapazes e outros que dependam de autorização judicial para dispor ou adquirir bens imóveis ou direitos a ele relativos.”
São essas as razões da recusa. Devolvo a Vossa Excelência a qualificação do título, com o devido respeito e acatamento.
São Paulo, maio de 2015.
SÉRGIO JACOMINO, oficial.
Eliane De Marco, escrevente.
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