Quinto Registro de Imóveis de São Paulo

Informação e prestação de serviços

349.801 – limitações administrativas – averbação

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NOTA TÉCNICA

Protocolo 349.801 – COMPANHIA DO METROPOLITANO DE SÃO PAULO – METRÔ

Restrições, limitações à propriedade – averbação – possibilidade?

A COMPANHIA DO METROPOLITANO DE SÃO PAULO – METRÔ formulou requerimento para que se proceda à averbação de “restrição construtiva” nas matrículas que indicou, “por estarem próximas às instalações operacionais do Metrô e pela possibilidade de alienação” dos ditos imóveis. Sugere a seguinte redação:

“Face à proximidade deste imóvel com as estruturas do Metrô, qualquer projeto previsto para a área não deverá interferir fisicamente e nem induzir esforços ou alívios adicionais àqueles computados no dimensionamento definitivo dessas estruturas. Dessa forma, os projetos com parecer técnico de consultor especializado, assegurando que o empreendimento proposto não causará danos à integridade das estruturas existentes, deverão ser submetidos previamente à Companhia do Metropolitano de São Paulo – METRÔ”.

Em face do pedido heterodoxo, submete a escrevente, Dra. CÁSSIA PADOVINI, à nossa apreciação o tema posto pela Companhia do Metropolitano.

Restrição, limitação ou mera obrigação?

A hipótese trazida convoca os temas de restrição ou limitação à propriedade e mera obrigação com eficácia real. Antes de proceder à averbação, é necessário perquirir qual seja a natureza jurídica do seu objeto.

A doutrina há muito distingue as figuras enunciadas. São bastante conhecidas as lições de PONTES DE MIRANDA no deslinde que faz entre restrição e limitação de direitos.

A expressão restrição aponta para atos e negócios jurídicos que diminuem o conteúdo dos direitos ou mitigam seu exercício. O “domínio não é ilimitável”, diz. “A lei mesma estabelece limitações. Nem é irrestringível. A lei contém regras dispositivas de restrição e os negócios jurídicos podem restringi-lo. As mais características das restrições são as restrições reais, ditas servidões”, remata[1].

Segundo o mesmo autor, as limitações ao conteúdo do direito de propriedade, lato sensu, ocorrem:

a) no interesse de vizinhos (direitos de vizinhança, a que correspondem deveres de vizinhança),

b) no interesse público, geral ou administrativo (especial), ou de algum serviço não-estatal, que tenha interesse para o Estado[2].

Ao passo que as restrições de domínio atraem as regras e princípios de direito privado, na consideração de que os negócios jurídicos possam diminuir ou mitigar o exercício dos direitos dominiais – como por exemplo no caso de servidão, usufruto, uso etc. – em face das limitações prepondera um elemento interno que conforma o próprio direito. Essas limitações encontram sua fonte na lei. Em regra, tais vicissitudes não dependem da publicidade registral, já que se projetam e vinculam todos – privados ou não.

O escopo da Lei 6.015/1973, Lei de Registros Públicos, é a garantia de autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos previstos pela legislação civil (art. 1º). As limitações ao conteúdo do direito de propriedade são irregistráveis (ou, como no caso se pretende: averbáveis).

SERPA LOPES, baseado na doutrina italiana, diz que as servidões legais escapam ao registro imobiliário “por lhes faltar conteúdo transcritível e pela sua íntima natureza, atento prescindir de título para sua existência”[3]. Submetem-se a um regime legal especial, diz, “v. g., proibição de não ultrapassar determinada altura nas proximidades da zona de defesa militar”. As restrições legais (como as servidões ditas “legais”) não se confundem com as servidões prediais, não estando, portanto, subordinadas à inscrição imobiliária[4].

O mesmo raciocínio se adota aqui: as limitações legais não se acham subordinadas à inscrição.

Lei 13.097/2015

Voltemos agora nossa atenção ao inciso III do art. 54 da Lei 13.097/2015 que prevê a “averbação de restrição administrativa ou convencional ao gozo de direitos registrados”.

A restrições convencionais nada mais são do que negócios jurídicos celebrados entre particulares no exercício da autonomia da vontade. Conformam-se à lei, estritamente falando, como nos casos em que se restringe o exercício dos direitos dominiais. Já as ditas “restrições” (rectius: limitações) administrativas são as que se originam de uma sentença judicial ou da própria lei.

São variados os exemplos de “restrições” administrativas: obrigação de não edificar acima do gabarito previsto, não proceder ao desmatamento de uma área ambiental sensível, observância, pelo particular, de áreas non ædificandi e tantas outras hipóteses encontráveis de sobejo, por exemplo, nos planos diretores das grandes cidades.

No caso concreto, pretende o METRÔ vincular terceiros que poderão adquirir imóveis que hoje estão na titularidade da Companhia. Porém, não é dado ao proprietário impor, a si mesmo, limitações ao exercício dos poderes inerentes à propriedade. Não se pode gravar e limitar o próprio direito real por antonomásia que é a propriedade. É evidente que o sucessor, caso queira construir, reformar ou demolir, empreender reformas estruturais, deverá aprovar o projeto na municipalidade, que certamente procederá às inspeções do projeto e levará em consideração as circunstâncias peculiares das áreas em questão e conformidade com as leis urbanísticas.

Obrigações propter rem

Por fim, a hipótese lembra as obrigações propter rem, em que se dá uma prestação específica que vai involucrada num direito real. Porém, não se pode alterar (em regra) a substância dos direitos reais (tipicidade), muito menos de modo unilateral, gravando-os. Revérberas dos direitos reais, as obrigações ditas propter rem devem estar previstas em lei.

Na pior das hipóteses, o METRÔ poderá manejar as ações de nunciação de obra nova (art. 1.299 do CC).

Em suma: a lei veda a autolimitação da propriedade e as limitações administrativas devem buscar seu fundamento na lei.

Conclusões

Portanto, e preliminarmente, deverá o interessado apresentar, de modo articulado e fundamentado, as bases legais ou jurisdicionais para o deferimento da averbação como perseguida.

São Paulo, 6 de maio de 2021.

SÉRGIO JACOMINO, Oficial.


NOTAS

[1] MIRANDA. Pontes de. Tratado, T. XI, § 1.163, n. 1.

[2] Loc. cit. § 1.164, n. 1.

[3] SERPA LOPES. Miguel Maria de. Tratado. Vol. III, 4ª ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1960, p. 119.

[4] Op. cit. p. 122.

Written by SJ

11 de maio de 2021 às 11:41 AM

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