Processo 100.10.026584-6. Casamento no exterior – Formal de partilha
Processo 100.10.026584-6 – Dúvida – Processo 0026584-52.2010.8.26.0100 – casamento no exterior
Interessado: I.A.
Formal de partilha – casamento. Casamento no exterior. Adquirente qualificado como casado no registro. Para o registro de formal de partilha do cônjuge pré-morto é necessária a averbação prévia do casamento e a perfeita identificação do cônjuge, data do casamento e regime de bens adotado. Casamento realizado no exterior. Necessidade de tradução por tradutor juramentado e registro no Cartório de Registro de Títulos e Documentos para validade no território nacional.
- Processo 100.10.026584-6 [0026584-52.2010.8.26.0100] – Formal de partilha – casamento. Acesso: http://kollsys.org/e2q
Sérgio Jacomino, 5º Oficial de Registro de Imóveis da Capital de São Paulo, atendendo à R. determinação de fls. 229 dos autos, vem prestar a Vossa Excelência as informações seguintes.
Foram sucessivamente apresentados os formais de partilha tirados dos inventários de J.J.J (ou J) e S.M.J, que consta terem sido casados anteriormente à aquisição do imóvel pela Transcrição 39.617, de 1º de setembro de 1961. Nas ocasiões em os títulos foram apresentados a registro, os mesmos foram devolvidos em virtude de óbices que constam da nota devolutiva cujo conteúdo e teor será objeto de detalhamento abaixo.
Como foram reapresentados ambos os títulos no bojo deste processo, providenciamos a sua prenotação – protocolos 239.532 e 240.661. Estas prenotações estarão em vigor até o desenlace deste processo.
Questão preliminar: a partilha de J.J.J não tem objeto
Quando foi apresentado ao Registro o formal de partilha extraído dos autos de inventário de J.J.J (Processo 583.00.2007.205219-2) constatou-se que ela havia falecido no estado civil de viúvo.
Para observância da continuidade do registro, nos termos do art. 237 da Lei 6.015, de 1973, foi solicitada a apresentação do formal de partilha do cônjuge pré-morto e a apresentação da certidão de casamento para a devida averbação (art. 167, II, 5 da mesma lei).
Apresentado formal de partilha extraído dos autos de inventário de S.M.J (Processo 000.85.821274-9), que consta ser esposa de J.J.J, verificou-se que o imóvel objeto da Transcrição 39.617 havia sido partilhado integralmente para os filhos do casal, O.J e N.Z (esboço de fls. 143 e homologação da partilha às fls. 157 destes autos).
A questão, portanto, centrar-se-á, exclusivamente na partilha de S.M.J. Uma vez realizado o seu registro, inviabiliza-se o registro do formal de J, por ferir o princípio da continuidade.
Averbação de casamento
O acesso do formal de partilha de S.M.J esbarra no seguinte óbice: necessidade de apresentação da certidão de casamento de J.J.J com S.M.J, para averbação, já que a qualificação pessoal do adquirente do imóvel da Transcrição 39.617 é escassa, constando apenas o estado civil (“casado”) sem que se tenha indicado o nome do cônjuge, data do casamento e regime de bens adotado.
A exigência se funda em Lei (art. 167, II, 5 cc. 176, § 1º, III, 2, ‘a’, da Lei n. 6.015/1973) e atine com o princípio de especialidade subjetiva.
A jurisprudência é uníssona na confirmação da exigência. Cito trecho do V. acórdão proferido na Ap. Civ. 44.562-0/6, DOE de 27.3.1998, São Paulo, rel. des. Sérgio Augusto Nigro Conceição:
O princípio da continuidade registrária impõe um perfeito encadeamento de titularidades, na medida em que somente será possível a inscrição de um direito se o outorgante aparecer no registro em momento imediatamente anterior.
Desta forma, o inconformismo não se sustenta, porque é induvidoso que a averbação do casamento do titular do domínio, realizável à margem da transcrição n° 35.191, do 12° serviço de registro de imóveis e anexos da Capital, é de absoluto rigor.
Este Colendo Conselho Superior da Magistratura já pacificou o entendimento no sentido de que a prévia averbação do casamento e do óbito é Indispensável ao registro da transmissão feita por quem comparece apenas como casado, sem qualquer outra qualificação.
E isso porque o matrimônio e o óbito representam fatos jurídicos de evidentes repercussões patrimoniais, condicionadas à atuação dos Registros Públicos, e cuja exterioridade é do interesse de todos.
Insustentáveis os argumentos contido nas truncadas razões recursais, que do item 6 de fls. 62 salta para o item 11 de fls. 63, no sentido de que deva ser prestigiada a origem judicial do título e da dificuldade ou impossibilidade na localização pessoal dos titulares do domínio.
A prévia averbação da circunstância é a medida que se impõe, mediante a apresentação de documentos hábeis, relembrando-se que, consoante tranquila orientação deste Colendo Conselho Superior da Magistratura, também os títulos judiciais submetem-se à qualificação do oficial registrador, principalmente para a verificação de sua conformidade com os postulados e princípios registrários (Apelações Cíveis n°s 15.028-0/7, da Comarca de Praia Grande, 20.745-0/6, da Comarca de Itu, e 22.417-0/4, da Comarca de Piracaia)”.
Em outro julgado, também do C. Conselho Superior da Magistratura, a necessidade de se observar o princípio da especialidade subjetiva é claramente reafirmada na Ap. Civ. 526-6/2 :
ESTRANGEIRO. QUALIFICAÇÃO PESSOAL – CPF/MF – CERTIDÃO DE CASAMENTO – EXIGIBILIDADE. ESPECIALIDADE SUBJETIVA.
Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Negativa de acesso ao registro de escritura de mútuo, confissão de dívida e fiança, com garantia hipotecária – Especialidade subjetiva (art. 176, § 1º, III, 2, ‘a’, da Lei n. 6.015/1973) – Qualificação do mutuante e credor hipotecário – Necessidade de discriminação do número do CPF e apresentação de certidão de casamento – Licitude das exigências – Pessoa física residente no exterior que está obrigada a se inscrever no CPF/MF, por ser titular de direito sujeito a registro (Decreto federal nº 4.166/2002 e Instrução Normativa SRF nº 190/2002) – Condição de casado, ademais, a ensejar a apresentação de certidão de casamento registrada no Registro de Títulos e Documentos, por se tratar de documento de procedência estrangeira (art. 129, n. 6, da Lei n. 6.015/1973) – Recurso não provido. Ap. Civ. : 526-6/2, j. 13/7/2006, Guarujá, Relator: Gilberto Passos de Freitas.
Do V. acórdão se extrai o seguinte trecho:
“Por outro lado, o Apelante indicou, ainda, a sua condição de casado, razão pela qual exigível a apresentação de sua certidão de casamento, que, na espécie, por se tratar de documento de procedência estrangeira, deverá ser registrada no Registro de Títulos e Documentos, com a devida tradução, para produção de efeitos no território nacional (art. 129, n. 6, da Lei n. 6.015/1973).
Ressalte-se que as exigências ora em discussão referem-se à chamada especialidade subjetiva do registro de imóveis, requisito básico e inafastável para determinar a titularidade dos direitos inscritos, concernente, na hipótese, à qualificação pessoal do credor em benefício de quem se instituiu a hipoteca”.
Concluindo, a apresentação da certidão de casamento é de rigor. Se a certidão é de origem estrangeira, como tudo faz supor (pela cópia da tradução juntada aos autos), para plena eficácia no território nacional haverá necessidade de registro no Registro de Títulos e Documentos (art. 129, n. 6, da Lei n. 6.015/1973).
Superação das dificuldades
Não deixa de ser constrangedor devolver, sem o competente registro, os títulos quando se vislumbra, com confortável segurança, que não há riscos ou prejuízos a terceiros.
Nos estritos limites impostos pela lei ao registrador, o título foi devolvido com as exigências já expostas e, nesta oportunidade, reiteradas.
Contudo, Vossa Excelência pode apreciar os elementos que passo a expor, já que os interessados alegam que não podem satisfazer as exigências formuladas por este Registro, nos termos do art. 198, in fine, da Lei 6.015, de 1973.
O caso é singular. Os interessados argumentam que o casamento se deu a 21 de fevereiro de 1928. Provaria tal fato a certidão do registro civil cuja existência a tradução juramentada nos dá notícia (fls. 119). O original teria se perdido. Por outro lado, o filho, Sr. O.J, argumenta que a cidade e seus registros foram arrasados na 2ª Grande Guerra. (fls. 118).
A certidão de óbito de S.M.J, embora ostente o caráter declaratório, confirma que era casada com J.J.J desde 1928. Na certidão de óbito de J, consta que era casado com S.( fls. 175). Ambas as certidões fazem constância da existência dos dois filhos do casal falecido – O e N, únicos herdeiros necessários.
Todos os documentos são congruentes entre si.
O art. 1.545 pode servir de arrimo à pretensão dos interessados:
Art. 1.545. O casamento de pessoas que, na posse do estado de casadas, não possam manifestar vontade, ou tenham falecido, não se pode contestar em prejuízo da prole comum, salvo mediante certidão do Registro Civil que prove que já era casada alguma delas, quando contraiu o casamento impugnado.
A “posse do estado de casado” é uma situação de fato que revela a probabilidade de serem o homem e mulher de que tratamos casados. A situação gera uma presunção relativa que milita em favor da prole comum, justamente os que foram contemplados na herança da mãe.
A posse do estado de casado é uma figura antiga e se estribou em elementos presuntivos: nominatio, tractacio e fama. Esses elementos parecem comprovados pelos documentos apresentados.
Certo de que se trata de matéria probatória, que refoge aos estritos limites deste procedimento administrativo, certo é, também, que, não se vislumbrando prejuízo a terceiros, Vossa Excelência, com base no permissivo do art. 198 da Lei 6.015, de 1973, poderá apreciar este caso em que se dá a presumida impossibilidade de cumprir as exigências do Cartório.
Devolvo a Vossa Excelência a qualificação do título, com as nossas cordiais saudações.
São Paulo, dezembro de 2010.
Sérgio Jacomino
Oficial Registrador