1034800-43.2014.8.26.0100. Adjudicação – Direitos de promessa não registrada – Continuidade – Título – cópia reprográfica
À Excelentíssima Senhora
Dra. TÂNIA MARA AHUALLI,
Juíza de Direito da 1ª vara de Registros Públicos de São Paulo.
Protocolo 273.890. Interessado: Condomínio Edifício Mainá.
Adjudicação. Direitos de promessa não registrada. Continuidade. Título – cópia reprográfica. Ação de adjudicação movida contra o titular inscrito. Feito extinto em relação ao proprietário inscrito e seguimento em face de promissário de contrato de promessa não inscrito. Ruptura do trato sucessivo. Cópia de títulos não se prestam à inscrição (art. 221 da LRP).
- Processo n. 1034800-43.2014.8.26.0100 – Sentença Pedido julgado procedente
Sérgio Jacomino, 5º Oficial de Registro de Imóveis da Capital de São Paulo, em atenção ao requerimento feito nos termos do art. 198 da Lei 6.015, de 1973, vem suscitar dúvida pelos fatos e fundamentos a seguir deduzidos.
Na ação de execução condominial, o Condomínio Edifício Mainá adjudicou os direitos decorrentes de promessa de compra e venda (não registrada) relativamente aos imóveis matriculado sob número 85.689 e transcrição 87.535, deste Registro.
Da ação foi extraída a respectiva carta de adjudicação que foi sucessivamente apresentada e devolvida por este Registro por evidente quebra do trato sucessivo (arts. 195 e 237 da Lei 6.015, de 1973). Afinal, na ação executiva figurou no polo passivo quem não ostenta direitos inscritos.
Buscando remediar a situação, o condomínio diligenciou a obtenção do original da promessa firmada entre o proprietário tabular para que, um vez inscrita, pudesse dar calço à adjudicação outorgada no processo executivo. Mas não logrou êxito.
Situação jurídica
Estamos diante do seguinte cenário:
a) A ação foi movida contra o condômino promissário-comprador. Oportunamente, os autores, percebendo corretamente que o compromisso não se achava inscrito, requereram ao juízo o aditamento da inicial para inclusão no polo passivo do titular inscrito – PM.
b) Este contestou, alegando ilegitimidade ad causam sob o pálio de que a responsabilidade patrimonial, decorrente de débitos condominiais, seria exclusiva do promissário-comprador (fls. 5).
c) O R. juízo reconheceu a ilegitimidade passiva de PM sob o mesmo argumento: a responsabilidade pelos débitos condominiais era mesmo do promissário-comprador. Baseou sua decisão em precedente do STJ (fls. 6) e julgou extinto o processo em relação ao corréu.
d) Ao final e ao cabo, após retificação da adjudicação (para ficar constando que os bens arrematados referiam-se exclusivamente aos direitos de promissário comprador) o R. juízo determinou a expedição da carta, tendo por objeto os direitos de promissário-comprador dos ditos imóveis da matrícula 85.689 e transcrição 87.535.
Pode-se concluir o seguinte:
a) A ação foi movida corretamente contra o titular de domínio.
b) A extinção do feito, por ilegitimidade de parte, seguiu contra o outro réu; ou seja: contra quem não é titular de domínio ou de direitos reais.
c) O argumento básico para a R. decisão repousou na consideração de que a responsabilidade pela obrigação condominial deveria recair sobre quem estava na posse, uso e gozo da coisa (RE 200.914-SP, STJ).
Penhora e adjudicação de direitos pessoais
A ação executiva poderia, efetivamente, ser dirigida contra o possuidor. Admite-se, mesmo, que pudessem ser penhorados os direitos de que era titular – como vimos, meros direitos pessoais decorrentes da promessa não inscrita.
Nestas condições, a adjudicação não poderia ultrapassar os limites estritos dos direitos de que era titular o executado. Por outra: o condomínio poderia postular a penhora e adjudicação de direitos pessoais, legitimando-se a pleitear em juízo, posteriormente, a adjudicação compulsória do imóvel, agora na condição de sub-rogante da promessa originária, tudo nos termos do art. 1.418 do CC. Porém, jamais poderia adjudicar direitos reais decorrentes de uma promessa que não foi regularmente registrada.
Eis o ponto fulcral da questão.
Agora, representado o contrato em cópia reprográfica, coloca-nos diante de um óbice intransponível – ao menos no âmbito da esfera decisória estrita deste registrador.
Cópias reprográficas do título
As cópias reprográficas não podem aparelhar as inscrições, nos termos do art. 221 da LRP. A jurisprudência é tranquila e uniforme no sentido de que a não apresentação do título acarreta a prejudicialidade da dúvida registrária (brevitatis causa: ® AC 0027170-35.2012.8.26.0451, Piracicaba, j. 10/12/2013, DJE 04/02/2014, rel. des. José Renato Nalini).
Impossibilidade de atendimento de exigências
Neste caso específico, os interessados declararam a impossibilidade de atender à exigência – isto é, de obter o original do título. Trata-se de circunstância que pode perfeitamente se conhecida por Vossa Excelência. E isto porque a própria lei abre uma brecha para estes casos muito específicos. Diz o art. 189 da Lei 6.015, de 1973:
Art. 198 – Havendo exigência a ser satisfeita, o oficial indicá-la-á por escrito. Não se conformando o apresentante com a exigência do oficial, ou não a podendo satisfazer, será o título, a seu requerimento e com a declaração de dúvida, remetido ao juízo competente (…).
Não podendo satisfazer as exigências do registrador, o Juízo poderá apreciar esta impossibilidade concretamente e, sopesando as circunstâncias, sempre em caráter excepcional, poderá deferir o registro. Esta é a atual orientação do Conselho Superior da Magistratura.
De fato, sopesando os riscos que o indeferimento (ou não) da inscrição representaria, o V. Conselho vem, de uns tempos a esta parte, considerando que, em certos casos, muito específicos, a negativa de acesso de títulos judiciais poderia significar um “desprestígio da razoabilidade” levando mesmo “ao enfraquecimento do princípio da segurança jurídica, o que é um contrassenso. Com a exigência, o que se perde, confrontado com o ganho, tem maior importância, de sorte a justificar a reforma da sentença: a garantia registrária é instrumento, não finalidade em si, preordenando-se a abrigar valores cuja consistência jurídica supera o formalismo” (AC 0039080-79.2011.8.26.0100, São Paulo, j. 20/09/2012, Dje 05/11/2012, rel. des. José Renato Nalini).
No mesmo sentido: AC 0027170-35.2012.8.26.0451, Piracicaba, j. 10/12/2013, DJE 04/02/2014, rel. des. José Renato Nalini, já citada; AC 0003273-76.2013.8.26.0019, Americana, j. 10/12/2013, Dje 04/02/2014, rel. des. José Renato Nalini; AC 0022011-63.2013.8.26.0100, São Paulo, j. 18/03/2014, rel. des. Elliot Akel.
Esta é uma circunstância especial.
Os interessados não puderam apresentar a registro o original da promessa de compra e venda que se acha acostada neste processo eletrônico. O R. juízo executivo tomou ciência do dito contrato por cópia apresentada e juntada no processo de execução e tal fato fundamentou a extinção do feito em relação ao proprietário; o executado não o impugnou. Todas as partes figurantes no contrato de promessa vieram a juízo e reconheceram a existência e validade do instrumento – agora reapresentado por cópia.
Por outro lado, suposto que o condomínio tenha se sub-rogado nos direitos de promissário-comprador – direitos pessoais, é certo, já que o contrato originário não foi regularmente inscrito (art. 1.417 do CC) – será possível, por analogia, aplicar uma espécie de reate do trato sucessivo, servindo o título judicial, com o reconhecimento da sub-rogação, para fundamentar a inscrição. É comum o cumprimento de uma compra e venda na pessoa de um cessionário em promessa e sucessivas cessões não inscritas. Consideram-se válidas e eficazes inter partes, não se exigindo o registro dos contratos intermédios.
O Condomínio sub-rogou-se nos direitos da promessa. Deverá manejar, eventualmente, uma ação de adjudicação compulsória em face do mesmo PM (art. 1.418 do CC). Neste interregno, poderá ver o seu direito abalado pela intercorrência de títulos contraditórios. Este é, enfim, o fator relevante que a não-inscrição representa: a concorrência de títulos contraditórios que poderão repercutir gravosamente nos interesses do condomínio que, seja como for, postulou corretamente.
Todas estas circunstâncias especiais podem ser conhecidas por Vossa Excelência. A minha atribuição se esgota no reconhecimento de que a cópia reprográfica não merece guarida no Registro Imobiliário e que, por infringência ao princípio da continuidade, a carta de adjudicação não poderá ser igualmente inscrita.
Devolvo a qualificação deste título a Vossa Excelência, com os protestos de elevada estima e consideração.
São Paulo, abril de 2014.
SÉRGIO JACOMINO, Registrador.