Quinto Registro de Imóveis de São Paulo

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1083298-63.2020.8.26.0100. Inventário – Partilha – meação – União estável – Título judicial – qualificação registral – limites. Título – cindibilidade.

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Processo 1083298-63.2020.8.26.0100.

Sérgio Jacomino, 5º Oficial de Registro de Imóveis da Capital de São Paulo, atendendo ao requerimento formulado pelo interessada, vem suscitar dúvida, pelos fatos e fundamentos a seguir deduzidos.

Procedimentos preliminares

Foi apresentado para registro o formal de partilha expedido em 21/5/2019 pelo 4º Tabelionato de Notas da Comarca de Ribeirão Preto, deste Estado, extraído dos autos de inventário e partilha do Espólio de LMN – Processo Z da 10ª Vara de Família e Sucessões de São Paulo. O título tem por objeto os imóveis das matrículas Imóvel “A”, Imóvel “B” e Imóvel “C”.

O formal foi devolvido acompanhado de nota devolutiva veiculada no protocolo X. A interessada insurge-se contra as exigências formuladas pelo Registro rogando a cindibilidade do título e, subsistindo as razões de denegação do registro, insta a suscitação de dúvida.

O título acha-se prenotado sob nº x, permanecendo em vigor a prenotação até solução deste processo de dúvida, nos termos do art. 203 da Lei nº 6.015, de 1973.

Situação registrária

Os imóveis acham-se matriculados sob números Imóvel “A”, Imóvel “B” e Imóvel “C” e consistem: (a) Apartamento nº 36; (b) Vaga nº 44 do tipo B; e (c) Vaga nº 15 do tipo C, todos do mesmo Edifício, situado na rua “X” 165, 181 e 187. Todos os bens acham-se registrados em nome de LMN.

Conforme se verifica do Formal de Partilha, o autor da herança faleceu em 25/11/2016 no estado civil de divorciado, figurando no registro como separado judicialmente. Consta do processo de inventário que o de cujus vivia em união estável com MLFA, tendo falecido sem deixar ascendentes ou descendentes, apenas colaterais – irmãos e sobrinhos.

As questões que foram levantadas e que impedem o acesso do título são as seguintes:

1. Inventário do todo

Com o falecimento do proprietário, independentemente da sua situação civil (casado ou vivendo em união estável) o patrimônio como um todo deve ser levado a inventário e partilha.

Neste caso, o que se verifica é que se inventariou somente 50% do patrimônio (na parte que não foi objeto de legado aos sobrinhos por testamento), tendo sido estremada a meação que já corresponderia à companheira (fls. 116 do processo de inventário).

A jurisprudência é pacífica. Independentemente da origem judicial do título, “ao inventário é levado o todo, somente sendo apurada a parte pertencente a cada um deles com a extinção da comunhão” [1].

Nos termos do inc. III do art. 1.829 do Código Civil, à falta de descendentes ou ascendentes, o cônjuge sobrevivente ou o companheiro herdam (STF – RE 646.721/RS).

Houve testamento (fls. 15-17) e de acordo com o ato notarial foi legado aos sobrinhos única e tão-somente o apartamento n. 36 (Matrícula Imóvel “A”) – não o box 44, como indicado no plano de partilha. Além disso, os valores superam a parte disponível e avança sobre a legítima. Neste ponto é preciso reconhecer que não cabe ao registrador adentrar no âmago da decisão judicial[2].

Seja como for, exige-se que seja levado ao inventário o todo.

2. Partilha

Relativamente aos imóveis, na partilha (fls. 115/125 dos autos), homologada conforme sentença (de fls. 205), verifica-se que o pagamento foi feito da seguinte forma:

IFSJ e MAS totalidade dos seguintes bens, na proporção de 50% para cada um:

Apartamento 36 (Matrícula Imóvel “A”).

Box 44, do tipo B (Matrícula Imóvel “B”).

MLFA: 50% do imóvel – Vaga 15 do tipo C (Matrícula Imóvel “C”).

A partilha, versando sobre 50% da vaga 15 (Matrícula Imóvel “C”), tem como pressuposto a ideia de que a outra metade já seria de propriedade da companheira. Todavia, somos levados a uma equivocidade a partir do requerimento firmado pela interessada:

“Já a vaga de garagem do imóvel sob o n. 15, tipo C, deverá ser registrada na quota (?) de 50% para os herdeiros do testamento (Sra. MSA e Sr. IFSJ) com quota de 25% para cada um e 50% para a companheira MLFA”

O plano de partilha que se acha à p. 115 dos autos parece indicar que a vaga 15 foi atribuída exclusivamente a ela, companheira, já que na quota-parte dos sobrinhos a vaga 15 não está arrolada.

Há ainda outro elemento complicador. A companheira apresentou requerimento a essa serventia solicitando que se procedesse apenas ao registro da partilha dos imóveis das matrículas Imóvel “A” e Imóvel “B” – apartamento 36 e vaga 44. Verbis:

“Ressalta-se que a entrada deste título requer apenas e tão somente o registro do imóvel cadastrado sob a matrícula n. Imóvel “C” [sic. O correto seria Imóvel “A”] e da vaga de garagem cadastrada sob o n. 44, do tipo B para os herdeiros (Sra. MSA e Sr. IFSJ) e apenas 50% vaga de garagem do imóvel sob o n. 15, tipo C.

O registro da vaga de garagem, sob o n. 15, tipo C, referente aos 50%, em nome da Sra. MLFA será, se por ela requerido, solicitado posteriormente.

Em não sendo possível o registro de vaga de garagem nestas condições (referente ao box cadastrado sob o n. 15, tipo C, esclarece a apresentante que não deseja efetuar o registro neste momento apenas em relação a esta vaga (de número 15) da garagem”.

Com o registro do título, como pretende a interessada, remanesceria por regularizar a vaga 15 do tipo C que continuaria em nome do de cujus.  

Além disso, diz que “não concorda com o registro do título em nome da companheira, tenho em vista que não restou nenhuma quota do imóvel para Sra. MLFA, conforme homologação do plano de partilha em que a mesma Sra. MLFA foi a inventariante”. Possivelmente refere-se ao apartamento 36 (Matrícula Imóvel “A”) e à vaga 44, do tipo B (Matrícula Imóvel “B”) – e não à vaga de garagem 15. Insiste na tese (e reincide na equivocidade):

“Conforme elucidado no parágrafo anterior, deixa de apresentar, uma vez que a manifestante não concorda com o registro do título em nome da companheira, tenho em vista que não restou nenhuma quota do imóvel para Sra. MLFA, conforme homologação do plano de partilha em que a mesma Sra. MLFA foi a inventariante”.

É preciso aclarar este ponto e torná-lo extreme de dúvida.

Cindibilidade do título

Vamos analisar a questão sob o prisma da situação de condominialidade da vaga 15 (M. Imóvel “C”). A fiar-se pela declaração da interessada, aparentemente equivocada – de que a vaga deverá ser registrada para os sobrinhos (25% para cada um) e 50% para a companheira –, temos que é inviável a cindibilidade do título para extremar e registrar somente a parte dos legatários[3].  

Por outro lado, seria possível, em tese, deixar de registrar a partilha relativamente à vaga 15, desde que aclarada a possível confusão apontada. Resta pendente de esclarecimentos o que afinal se requer: ou o bem será partilhado na totalidade à companheira, como parece ter sido definido no plano de partilha, ou será registrado como sugere na sua petição – em condomínio com os sobrinhos.

Vaga de garagem – pessoa estranha ao condomínio

Há no Código Civil uma regra que vem insculpida no § 1º do art. 1.331:

Art. 1.331. Pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclusiva, e partes que são propriedade comum dos condôminos.

§ 1º As partes suscetíveis de utilização independente, tais como apartamentos, escritórios, salas, lojas e sobrelojas, com as respectivas frações ideais no solo e nas outras partes comuns, sujeitam-se a propriedade exclusiva, podendo ser alienadas e gravadas livremente por seus proprietários, exceto os abrigos para veículos, que não poderão ser alienados ou alugados a pessoas estranhas ao condomínio, salvo autorização expressa na convenção de condomínio.

A norma cinge-se a limitar o poder de disponibilidade dos proprietários que não poderão alienar ou onerar o bem a “pessoas estranhas ao condomínio, salvo autorização expressa na convenção de condomínio”.

Neste caso concreto, não se trata de uma alienação voluntária do bem a pessoa estranha ao condomínio. Parece razoável que, nos casos de sucessão mortis causa ou nos de execução judicial[4], o registro dos títulos sempre será possível, criando-se, porém, uma limitação ao poder de dispor: o bem somente poderá ser alienado a pessoas que não sejam estranhas ao condomínio – salvo disposição expressa na convenção de condomínio.

Conclusões

Permita-me Vossa Excelência indicar uma síntese do desenvolvido até aqui. O registro não poderá, por ora, ser registrado pelos seguintes motivos:

  1. O patrimônio do inventariado constitui uma universalidade de bens que só perde essa característica com a partilha. Na partilha atribuem-se os quinhões hereditários e a meação da companheira. Deve ser levado a inventário e partilha a totalidade do imóvel objeto da matrícula n. Imóvel “C”, tendo em vista a aquisição do patrimônio a título oneroso na constância da união estável. Fundamento legal: artigos 1.658 c.c. art. 1.725 do Código Civil; art. 620, inciso IV, e 651, incisos II e III, do Código de Processo Civil.
  2. Esclarecer claramente o que se pretende com a vaga de garagem n. 15 (M. Imóvel “C”), já que parece haver certa confusão na postulação de cindibilidade do título. Os esclarecimentos são necessários para que se evitem controvérsias no futuro.

Devolvo a Vossa Excelência a apreciação do pedido, com o devido respeito e acatamento.

São Paulo, 3 de setembro de 2020.

SÉRGIO JACOMINO, Oficial.


Notas

[1] Ap. Civ. 0001518-27.2017.8.26.0035, Águas de Lindóia, j. 12/11/2018, Dje 22/3/2019, rel. des. Geraldo Francisco Pinheiro Franco. Acesso: http://kollsys.org/n1f, com indicação de precedentes.

[2] Ap. Civ. 1015351-23.2015.8.26.0405, Osasco, j. 4/7/2017, Dje 22/1/2018, rel. des. Manoel de Queiroz Pereira Calças. Acesso: http://kollsys.org/l5g.

[3] Ap. Civ. 1000506-36.2018.8.26.0128, Cardoso, j. 23/11/2018, Dje 21/1/2019, rel. des. Geraldo Francisco Pinheiro Franco. Diz o relator: “Não se pode registrar a propriedade de apenas uma pessoa, seja meeira, seja herdeira, e deixar em aberto a titularidade dominial da outra fração ideal dos imóveis. Se assim o for, não haverá qualquer segurança jurídica, pois não se saberá, de fato, quem são os proprietários da outra metade daqueles imóveis”. Acesso: http://kollsys.org/moy.

[4] No caso de execução judicial já se admitiu o registro de arrematação sob o argumento de que uma vez “reconhecida a possibilidade de penhora da garagem de forma autônoma, deve-se entender que sua alienação forçada levaria a existência de aquisição da propriedade por terceiro estranho ao condomínio, sem que o registro pudesse ser impedido”. V. Processo 1003300-17.2018.8.26.0100, j. 20/3/2018, Dje 4/4/2018, Dra. Tânia Mara Ahualli. Acesso: http://kollsys.org/lll. No mesmo sentido: Processo 1046713-46.2019.8.26.0100, j. 24/6/2019, Dje 27/6/2019, da mesma magistrada. Acesso: http://kollsys.org/nj8

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