Quinto Registro de Imóveis de São Paulo

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1167144-70.2023.8.26.0100. Compra e venda – alienação a terceiros. Escritura não registrada. Ônus – inoponibilidade.

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Compra e venda. Imóvel alienado a terceiros anteriormente. Escritura não registrada. Ônus – inoponibilidade.

Processo 1167144-70.2023.8.26.0100, j. 19/12/2023, DJe 19/12/2023, Dra. Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad. Acesso: http://kollsys.org/tp9

Procedimentos preliminares

Foi-nos apresentada a anexa escritura de compra e venda, lavrada pelo Tabelião de Notas desta Capital, pela qual BT S/A vendeu o imóvel objeto da matrícula para PMDP e sua mulher CPIMDP.

O título foi protocolado, examinado e posto em devolução pelos motivos abaixo indicados. Prenotação n. 386.635, em data de 16/10/2023. Posteriormente, em 23/10/2023, o mesmo título reingressou sob mesma prenotação com pedido de suscitação de dúvida requerido por CABS, advogado.

Exigências – fundamentos

Pela Av. 3 da Matrícula, verifica-se que o imóvel foi incorporado ao patrimônio de BT S/A em virtude de transformação societária. Posteriormente, a 28/6/2013 (Av.) o imóvel foi incorporado por ABS. Por fim, a 28/6/2013 (Av.) em razão de cisão o imóvel foi vertido para o patrimônio das sociedades: 1) BC S/A e 2) BS S/A, atuais proprietários.

Já a escritura pública, lavrada em 8/4/1994, somente agora foi apresentada a registro. Certo é que o título fora lavrado antes da incorporação do imóvel ao patrimônio de terceiros, mas não foi apresentada e registro, de modo que o imóvel já não se acha no patrimônio do alienante, obliterando o acesso da escritura.

Em suma, tendo em vista que a vendedora não é mais proprietária do bem, não é possível o registro da escritura sem malferir o princípio da continuidade registrária previsto nos artigos 195 e 237 da Lei 6.015/73.

A jurisprudência não destoa. Há muito firmou o STJ o entendimento de que nem mesmo a boa-fé do primeiro adquirente é suficiente para que se anule a transferência da propriedade que se operou secundum tabula (art. 1.245 do CC):

Se duas distintas pessoas, por escrituras diversas, comprarem o mesmo imóvel, a que primeiro levar a sua escritura a registro é que adquirirá o seu domínio. É o prêmio que a lei confere a quem foi mais diligente”[1].

Por fim, assinale-se que o registro é obrigatório consoante expressa disposição contida no art. 169 da LRP. Embora a lei não preveja sanção expressa pela inércia do interessado, é possível considerar que a lei criou um ônus em sentido próprio, i. e., faculdade prevista na lei para a obtenção de uma certa vantagem – “faculdade cujo exercício é necessário para a realização de um interesse”, como disse EROS GRAU. E segue o professor:

“0 ônus, dest’arte, é um vínculo imposto à vontade do sujeito em razão do seu próprio interesse. Nisto se distingue do dever – e da obrigação – que consubstancia vínculo imposto àquela mesma vontade, porém no interesse de outrem. Por isso que o não-cumprimento do ônus não acarreta, para o sujeito, sanção jurídica, mas tão-somente uma certa desvantagem econômica: a não obtenção da vantagem, a não satisfação do interesse ou a não realização do direito pretendido”.

O ônus seria, assim, o “instrumento através do qual o ordenamento jurídico impõe ao sujeito um determinado comportamento, que deverá ser adotado se não pretender ele arcar com as consequências que lhe serão prejudiciais”[2].

Trata-se no fundo de inoponibilidade de direitos não inscritos em face do registro imobiliário (§ 1º do art. 54 da Lei 13.097/2015). O registro, como se sabe, enquanto não cancelado, produz todos os seus efeitos (art. 252 da LRP).

Estas são as razões pelas quais o registro não se consumou.

Devolvo a Vossa Excelência o exame da pretensão resistida pelo Cartório.

São Paulo, 28 de novembro de 2023.

SÉRGIO JACOMINO
Oficial


Notas

[1] STJ RESP 104.200 / SP, j. 24/5/2000, DJ 4/9/2000, Rel. Min. César Asfor Rocha. Acesso: http://kollsys.org/tjf. Vide também: TJSP Ap. Civ.  0127460-49.2009.8.26.0003, 4ª Câmara de Direito Privado, j. 12/12/2013, DJ 13/12/2013, rel. Carlos Henrique Miguel Trevisan.

[2] GRAU. Eros. Nota sobre a Distinção entre Obrigação, Dever e Ônus. São Paulo. Revista da FD-USP, v. 77 (1982).

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